Sim, mas não por causa do dinheiro.

por António Pedro Barreiro

Não quero contribuir para a grande polémica do palco das Jornadas. O palco, intuitivamente, parece-me feio – e, portanto, quanto mais caro, maior e mais permanente, mais me pesa a feiura. Mas não sou engenheiro de estruturas, não conheço o projecto em detalhe, nem as alternativas, nem as razões que levaram a Câmara de Lisboa a optar por este modelo. Fico, em princípio, contente de ver Portugal aproveitar um evento da magnitude das Jornadas para remodelar uma zona degradada dos arredores da capital, porque isso garante que os efeitos não se esgotam quando acabarem as Jornadas, depois de rebentarem os foguetes e se apanharem as canas, mas hão-de perdurar na vida de muita gente. Gente que, há uns meses, quando abria a janela de casa, via contentores ferrugentos e um aterro de lixo, e passará a ver um jardim aberto ao rio, com luz natural e ar puro. Não é coisa pouca.

Vejo que, a propósito do palco, se levantaram vozes indignadas, que acham que o Estado e as autarquias não deviam contribuir de modo algum para a JMJ. Como se receber 1,5 milhões de jovens do mundo inteiro fosse assunto da Igreja, meramente religioso e privado, que nada dissesse à sociedade e ao bem comum.

Do lado católico, vai-se respondendo, talvez timidamente, que as Jornadas devem ser apoiadas porque vão dar dinheiro. Custa-me o uso e o abuso deste argumento. Não porque seja mentira (em todo o lado em que foi feita, a JMJ significou sempre grandes retornos económicos para os países que a receberam), mas porque é poucochinho. Que acharíamos de alguém que mandasse os filhos visitar os avós, não porque seja boa e justa a visita, mas porque “a avó dá-te sempre 20 euros”? Soa a rasteiro, a mesquinho. É fazer a coisa certa, mas pela razão errada.

Sim, as Jornadas devem ser apoiadas, mas não apenas – nem sobretudo – por causa do dinheiro que trazem. Merecem apoio e entusiasmo, por causa dos bons frutos que podem trazer à sociedade portuguesa.

As Jornadas significam, para uma geração que passou três anos fechada em casa por conta da pandemia e do isolamento social, e que fez cursos universitários inteiros sem criar laços presenciais com os próprios colegas, a oportunidade de conhecer jovens de todo o mundo. Problemas sérios de socialização e de saúde mental não se resolvem num mega-evento de uma semana. Mas há um sinal, um empenho, um compromisso com os jovens, uma esperança que se acende.

Há, depois, todos os outros – adolescentes e jovens – que nunca puderam sair do país, ou que nada conhecem fora do perímetro de uma aldeia ou de um vilarejo do interior e que encontrarão na JMJ a chance singular de abrir horizontes e conhecer outras gentes.

E há esses milhares de pessoas – famílias com mais ou menos problemas, idosos que vivem o peso da solidão, gente esperançosa ou desesperada – que vão abrir as casas para acolher peregrinos. É um gesto de generosidade que, com elevada probabilidade, fará mais por quem dá do que por quem recebe. Vão forjar-se amizades para a vida; vai experimentar-se todo o ímpeto de novidade do encontro.

Um país deprimido e envelhecido, com a natalidade mais baixa da Europa e as novas gerações drenadas pela emigração e pela ausência de horizontes vai receber centenas de milhares de jovens, de todas as cores, culturas, proveniências e vivências. Que pode isto fazer por nós?

Vai falar-se da beleza da família, num país onde os jovens têm medo de casar e ter filhos antes dos 30 anos. Vai falar-se da grandeza da vocação, num país em que a juventude está tolhida de preocupações sobre o futuro. Vai falar-se de fidelidade, num tempo em que dominam o precário e o descartável. Vai falar-se de comunidade, numa hora em que o individualismo nos divide. Vai falar-se de paz quando se adensam as trevas da guerra. Vai falar-se de uma relação justa com o mundo criado, num tempo de ansiedades ecológicas. Vai falar-se de Deus. Vai falar-se do Homem. E isso, pense-se o que se pensar sobre o assunto, é uma conversa que nos interessa a todos.

Parece que, além de todas estas coisas, a JMJ também poderá fazer mexer a economia nacional. Vai dar lucro. Ainda bem. Mas vai dar muito mais do que lucro.

Scroll to Top